Como é possível notar, nascido no seio de uma família de músicos (e de poetas!), Vinicius teria forte presença dessa arte superior, que é a música, por toda sua vida.
Poeta do amor e da comunhão, participou de toda a renovação da música brasileira em parceria com os grandes compositores do país. A vida, considerada por ele a "arte do encontro", tinha o sentimento de mistura e comunhão.
Vinícius de Moraes passou a vida rompendo convenções sociais. Passou da poesia culta para a popular, misturando ritmos brancos com negros, samba com candomblé e o comportamento aristocrático com o boêmio. Derrubou convenções também na área literária, usando o soneto após a revolução modernista de 1922, que cassava a composição dos 14 versos.
Diplomata de carreira, escandalizou a sociedade ao dar entrevistas cantando com um copo na mão. Em parceria com Tom Jobim, sua peça ‘Orfeu do Carnaval’, ganhou a Palma de Ouro no Festival de Cannes, ao ser transformada por Marcel Camus no filme ‘Orfeu Negro’. Mais tarde junto a Tom Jobim e João Gilberto criou a bossa-nova, um dos principais movimentos de renovação musical do Brasil. Entre os sucessos de Vinícius, destacam-se ‘Tarde de Itapoã’, ‘Garota de Ipanema’ e clássicos da MPB, como ‘Marcha da Quarta-Feira de Cinzas’, ‘Samba da Benção’ e outros.
Em viagem de volta a Europa, sofre um derrame cerebral no avião. Perdem-se, na ocasião, os originais de Roteiro lírico e sentimental da Cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro.
É operado a 17 de abril, para a instalação de um dreno cerebral.
Vinícius de Moraes morreu aos 66 anos, em 9 de julho de 1980, no Rio de Janeiro, de edema pulmonar, em sua casa, na Gávea, em companhia de Toquinho e de sua última mulher.
Extraviam-se os originais de seu livro O dever e o haver. mas suas obras sobrevivem até hoje.
A obra de Vinicius
A obra poética de Vinícius de Moraes é tradicionalmente dividida pela crítica em três fases distintas.
A primeira inicia-se em 1933 e abrange os livros O caminho para a distância (1933); Forma e exegese (1935); Ariana, a mulher (1936). Nesse período encontramos um poeta místico, que escrevia versos longos, de tom bíblico-romântico, de espiritualidade católica e visionária. O próprio poeta caracterizou esta fase como "o sentimento do sublime". Na "Advertência" à sua Antologia Poética ele afirmava que "a primeira [fase], transcendental, frequentemente mística, [era] resultante de sua fase cristã".
A segunda fase (ou como se costuma dizer: o segundo Vinicius) tem início em Cinco Elegias, de 1943. O novo tom, a nova linguagem, as novas formas e temas, que vinham desde Novos poemas, de 1933, intensificam-se e diversificam-se nos livros posteriores - Poemas, sonetos e baladas (1946) e Novos poemas II (1959) -, em que se mostram tanto as formas clássicas (soneto de tradição camoniana e shakespeariana) quanto a poesia livre (em "A última elegia", os versos têm forma de serpente). O poeta sente-se à vontade para inventar palavras, muitas vezes bilíngues, ou praticar a oralidade maliciosa.
Por haver nessa fase uma renúncia à superstição e ao purismo fortemente presentes na primeira, bem como um direcionamento para uma atitude mais brincalhona e amorosa perante a poesia, essa segunda fase ficou conhecida como "O encontro do cotidiano pelo poeta".
Nessa passagem do metafísico para o físico, do espiritual para o sensual, do sublime para o cotidiano, o poeta retoma sugestões românticas (como lua, cidade, samba). Refugia-se no erotismo: há contemplação do amor, poemas "sobre a mulher" e adoração panteística da natureza. Compôs também poemas de indignação social, cujos exemplares são: "Balada dos mortos dos campos de concentração", "O operário em construção" e "A rosa de Hiroxima".
O terceiro Vinicius é o compositor, letrista e cantor. Autor de mais de trezentas músicas (como atesta seu Livro de letras, lançado postumamente, em 1991, onde estão mais de 300 letras de músicas de sua autoria), difundidas pelo mundo com o grande acontecimento cultural e musical que foi a bossa nova. Seus parceiros, como vimos, vão desde Bach a Toquinho.
Embora a crítica fizesse (faça) tal divisão, colocando de um lado o poeta e de outro o showman, Vinicius nunca concordou que houvesse diferença entre seus sambas e seus poemas escritos, pois para ele tudo era igual.
Sua poesia, além de ser a encarnação do movimento e do transitório, elege a busca como motor primordial: do divino, da coisa ordinária, do homem concreto, do homem social, do homem banal, do amante e, sobretudo, da mulher. E na busca da mulher, das infinitas mulheres que se concentram e se desprendem de uma mulher, a afirmação do motivo principal: "mudança", "evolução", "transição". Poeta viril e terno, transcendental e carnal, caudaloso e contido, ele fez de sua obra o lugar do encontro e da despedida. Talvez, nenhum outro poeta personifique tão bem e ao mesmo tempo o apolíneo e o dionisíaco, tanto na obra quanto na vida: ao lado da sobriedade e da lucidez já bem precoces, surge e cresce o espírito da embriaguez e da entrega total, em nome da reflexão e da vitalidade que reinam em sua poesia. Enfim, não importa que Vinícius parta do etéreo para chegar ao real, o que mais vale em sua obra é a busca da fusão com a vida.
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